TEXTO CRÍTICO
pra começo de conversa por Viviana Bosi
Esta árvore dá pitanga, e aquela, jabuticaba. O vento balança os galhos de uma em direção à outra, cada qual com suas próprias frutas de sabor especial. Mas será que as raízes conversam entre si? Na mata brasileira, as árvores são parceiras, como os artistas proseando sem fim, com olhares e cores, ou com sons de vento e música. Amizade que vai crescendo, como liames de cipó a se enredar entre os troncos. Se Fernando rima na gravura, Álvaro desenha linhas no poema.
Cada série de trabalhos brotou de uma floração ímpar, com tons diversos uns dos outros. Os matizes são múltiplos, desde o cacto que nasce no árido até a leveza do sol dominical. Como mosaicos ou búzios que giram e caem em posições inesperadas, com configurações variáveis, Álvaro e Fernando vão revelando outras faces, máscaras, estilhaços da memória. A vivência de ambos combina visões de dança no vento, e, também, ecos de violência, opressão, grito.
Há trabalhos de invenção colorida, para brincadeira e acalanto de enamorados. Há, igualmente, com muita força, denúncia e ironia.
Como essa vida nossa, fraturada entre momentos tranquilos de café e amor, enquanto homens e mulheres gemem com o lamento na garganta sob a coerção do poder.
Álvaro compôs a elegia urbana deste país que espezinha o pobre, em suas flores do mal contemporâneas; Fernando absorveu dores e alegrias simultâneas, abarcando num painel sincrônico as horas negras e azuis do mundo, que contêm tanto a serenidade radiante da praia quanto o agressivo trompete militar.
Assim, os aventureiros que explorarem esta exposição encontrarão surpresas alternadas: vibração de choque ou acolhimento. São os giros de caracóis, emaranhando os nós e a nós, que vamos cruzando e costurando linhas junto aos dois artistas para transitar nessa teia-estrela feita de brilhos e espinhos. |
ARTELETRA EM TRÂNSITO
A exposição Arteletra em Trânsito parte das relações e experiências entre poesia e imagem, fruto da parceria entre o poeta Álvaro Faleiros e o artista e ilustrador Fernando Vilela.
A mostra é formada por 93 trabalhos produzidos nos últimos 20 anos, agrupados em séries, além de obras inéditas. São conjuntos de gravuras, pinturas, desenhos, esboços, processos, estudos e poemas dos livros Caracol de Nós, À Flor do Mal, Meio Mundo, Achando a Chave, Invento no Vento (inédito), O Voo de Vadinho e O Sapoeta.
Apresentando imagens nunca antes expostas, pensadas para um público de todas as idades, essa exposição possibilita uma experiência instigante de imersão no universo da poesia e das artes visuais.
A mostra ocupará as quatro salas da Casa das Rosas, integrante da Rede de Museus-Casas Literários da Secretaria da Cultura e Economia Criativa do Estado de São Paulo, gerenciada pela Poiesis.
Álvaro Faleiros
É professor livre-docente de literatura francesa na USP, poeta e tradutor. Seus mais recentes livros de poemas são Caracol de nós e À flor do mal, com ilustrações de Fernando Vilela, ambos publicados em 2018 pelo selo Demônio Negro. Como tradutor publicou, entre outros, Caligramas, de Guillaume Apollinaire (Ateliê/UnB, 2008; 2ed2019) e Um lance de dados, de Mallarmé (Ateliê, 2013; 2ed 2017). Como crítico de tradução, publicou recentemente A retradução de poetas franceses no Brasil: de Lamartine a Prévert (com Thiago Mattos; Rafael Copetti, 2018) e Traduções canibais: uma poética xamânica do traduzir (Cultura e Barbárie, 2019), também lançado na Colômbia com o título Traducciones Caníbales: una poética chamánica del Traducir em tradução de Carolina Villada Castro (coedição Editorial Universidad de Los Andes e Editorial Universidad de Antioquia).
Fernando Vilela
É artista, autor, ilustrador de livros e professor, vive e trabalha em São Paulo. Utiliza diversas linguagens, como gravura, desenho, colagem, escultura, instalação e fotografia. Realizou exposições na Pinacoteca do Estado de São Paulo, no Centro Cultural São Paulo e foi contemplado pelo Prêmio Funarte de Arte Contemporânea. No exterior, expôs na Bélgica, França, Espanha, Portugal, Estados Unidos e México. Como autor e ilustrador, já publicou em 10 países. Dentre seus livros premiamos detacam-se Lampião e Lancelote (Ed. Zahar, 2007), Cacería (Ed. Babel, 2014, Colombia), Los heróes del Tsunami (Ed Ekaré, 2016, Espanha/Venezuela) e Along Tapajós (Ed. Two Lions, 2020, Estados Unidos). Por seus livros ilustrados recebeu cinco prêmios Jabuti e a Menção Honrosa Novos Horizontes do Prêmio Internacional Bologna Ragazzi Award.
Serviço
Exposição – Arteletra em Trânsito
Curadoria | Álvaro Faleiros e Fernando Vilela
Abertura | 5 de fevereiro, quarta-feira.
Período de exposição | até 29 de março (domingo)
Funcionamento do museu
Terça-feira a sábado, das 10 às 22h
Domingos e feriados, das 10 às 18h
Casa das Rosas – Espaço Haroldo de Campos de Poesia e Literatura
Avenida Paulista, 37 – Paraíso – São Paulo (próximo à estação Brigadeiro do metrô)
Telefone | (11) 3285-6986 | 3288-9447
Convênio com o estacionamento Parkimetro: Alameda Santos, 74 (exceto domingos e feriados)
www.casadasrosas.org.br
Sobre a Casa das Rosas
A Casa das Rosas – Espaço Haroldo de Campos é um museu dedicado à poesia, à literatura, à cultura e à preservação do acervo bibliográfico do poeta paulistano Haroldo de Campos, um dos criadores do movimento da poesia concreta na década de 1950. Localizada em uma das avenidas mais importantes da cidade de São Paulo, a Avenida Paulista, o espaço realiza intensa programação de atividades gratuitas, como oficinas de criação e crítica literárias, palestras, ciclos de debates, exposições, apresentações literárias e musicais, saraus, lançamentos de livros, performances e apresentações teatrais. O museu está instalado em um imponente casarão, construído em 1935 pelo escritório Ramos de Azevedo, que na época já tinha projetado e executado importantes edifícios na cidade, como a Pinacoteca do Estado, o Teatro Municipal e o Mercado Público de São Paulo.
Sobre a POIESIS
A Poiesis – Organização Social de Cultura é uma organização social que desenvolve e gere programas e projetos, além de pesquisas e espaços culturais, museológicos e educacionais, voltados para a formação complementar de estudantes e do público em geral. A instituição trabalha com o propósito de propiciar espaços de acesso democrático ao conhecimento, de estímulo à criação artística e intelectual e de difusão da língua e da literatura. |